segunda-feira, setembro 25, 2023

Democratizar a energia é o caminho natural


Na Assembleia Geral da ONU, dia 19, Lula destacou entre outros temas, democracia e energia. Seu pronunciamento, perfeito, não mereceu nenhum reparo: só aplausos. Embora não tenha associado diretamente democracia com a energia solar, esse é o caminho natural. A necessidade de fazer essa observação se deve a uma crescente movimentação de setores comprometidos com outros interesses, que procuram confundir a opinião pública, criando dificuldades para que a energia do sol entre nas casas, no comércio, no campo.

Para dar sustentação a essa preocupação, é preciso viajar no tempo. Em 1973, no Instituto de Pesquisas Hidráulicas da UFRGS, estudava modelos reduzidos de grandes barragens. Logo depois, no Departamento de Águas e Energia Elétrica, o trabalho foi modernizar e as estações hidrológicas que tínhamos na Região Sul. Em 1977 já na Eletrosul, foram anos de dedicação para avaliar o potencial hidroelétrico da Bacia do Rio Uruguai. As usinas que se mostraram viáveis, foram construídas e estão operando. 

Em 2002 quando me elegi deputado federal, fui para as Comissões Permanentes do Meio Ambiente, Minas e Energia, Ciência e Tecnologia. Por ter trabalhado no planejamento energético da Eletrosul/Eletrobras, tinha uma certeza: as melhores usinas hidroelétricas já estavam identificadas e quase todas construídas. As que faltavam estavam na região amazônica, com grande impacto ambiental e altos custos de transmissão. Para agravar, a região é conhecida por longos períodos de estiagem que comprometem o fator de capacidade das usinas. Em outras palavras, no período seco: muita turbina para pouca água.

Com essas informações na cabeça, sabia que a nossa matriz energética precisava incorporar outras fontes de energia. No mundo todo as preocupações com o clima já mostravam o caminho, energias alternativas livres do CO² como eólica e solar. Foi assim que críamos em 2003 a Frente Parlamentar em Defesa das Energias Alternativas, com 207 deputados. Nunca nos reunimos por falta de quórum. Não se trata de um desabafo, apenas uma constatação: políticos priorizam temas imediatos e de preferência que tragam votos.  

Felizmente, em 2007, com a criação do Instituto IDEAL, conseguimos apresentar o sol como a fonte de energia do futuro. Inicialmente no Brasil, depois em boa parte da América Latina. O projeto América do Sol do Instituto IDEAL, focado no mundo acadêmico, levou conhecimento onde até então não havia. Um legado importante já que conseguimos através das universidades, chegar com o concurso de pesquisa "Ecológicas" a 14 países.   

A energia solar como a eólica, embora intermitentes, podem e vão dar um grande impulso no que vem sendo chamado de hidrogênio verde, que é a quebra da molécula de água (H2), via eletricidade proveniente de uma fonte de energia renovável. Segundo um relatório inédito do Boston Consulting Group (BCG), o potencial do Brasil é imenso. Ainda nessa década o H2V vai estar presente na mobilidade urbana, nos processos industriais e na descarbonização do campo. A transição energética é, o grande legado do novo mundo.

Até agora tudo que escrevi está armazenado na cabeça, não tem nada de inteligência artificial. Quando leio textos cujas interpretações vão na direção de nos confundir, logo percebo quais são os interesses em jogo. Se criam dificuldades para se obter benefícios interpretativos da legislação, ou subsídios direcionados para determinados segmentos. Se  utilizam de "pequenos detalhes", para trazer insegurança. Um caso marcante e recente, foi a farsa da privatização da Eletrobras e seus desdobramentos.   

Outra situação que não conseguem esconder o incômodo, é quando se fala em geração distribuída. O modelo em curso que caminha na direção da democratização da energia, é antes de tudo libertário. Tanto assim que a preocupação dos lobistas é na sua crescente participação no que o setor chama de "mercado cativo". Se sentem ameaçados quando uma casa, um comércio, uma padaria, passa a gerar sua própria energia e se liberta da alta conta de luz que paga. A reação é tão grande que contamina o bom debate. (*)

Recentemente uma publicação procurou quantificar valores partindo de premissas equivocadas, justamente para obter um número que impactasse o leitor. Não é verdade que as pessoas estão pagando energia mais barata, porque reduziram sua conta de luz num valor significativo. Se houve redução, foi no consumo e não na tarifa. Os kwh de energia solar gerada no telhado da casa foram consumidos naquela unidade, reduzindo, obviamente, o valor da fatura. Isso eles sabem, só que não querem explicar.

Já temos bem mais de uma Itaipu instalada em geração distribuída. Por coincidência, acabamos de pagar a usina de Itaipu esse ano. Quantos bilhões de dólares foram investidos lá nesses 50 anos. Portanto, prestem atenção: quanto mais investimento se fizer na geração distribuída, melhor para o país. O sol está disponível, o investimento é privado e pulverizado. São milhões de pessoas permitindo que se limpe a matriz energética, sem depender de recursos públicos pra atender a demanda de energia. O sol e o vento estão nos ajudando muito. O Brasil é líder na América Latina e vai continuar sendo por muito tempo.

(*) Não querem discutir a CCC, Conta Consumo de Combustíveis, que canaliza bilhões de reais por ano para pagar o diesel, o eterno carvão e o futuro gás embutido nos "jabutis do Lira". Lá é que estão os grandes subsídios, mas preferem se calar.

PS - Um breve histórico pessoal se fez necessário, para conhecerem o passado. Essa discussão que está na grande mídia, trata do futuro. As divergências de opinião são bem vindas. Elas ajudam a encontrar o melhor caminho. Que venha uma energia renovável, limpa e acessível à todos.       

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