A política não é a arte de engolir sapo, como alguns costumam dizer. Política é a arte de fazer o bem. De pensar nos outros, não em si e nos seus. Portanto, não é um fardo e sim uma relação prazerosa. Infelizmente, não é o que se vê. Na semana passada o Centrão não gostou da pouca atenção que o governo deu à dois contrabandos que foram impostos em troca da malfadada governabilidade. O caso mais vergonhoso e constrangedor, com certeza foi a troca de Ana Mozer pelo deputado Fufuca, no Ministério do Esporte.
Lula, que conhece como poucos a nossa realidade, sabe da urgência de uma reforma política. Foi Deputado Constituinte em 1987/1991, eleito com 615 mil votos. A maior votação de um deputado federal até então. Na eleição seguinte saiu como candidato a presidente da República, mesmo sabendo das enormes dificuldades que teria. O seu principal objetivo era nacionalizar o partido, formar novos quadros e oferecer uma opção ao eleitor que rompesse com a mesmice..
Sem estrutura e sem dinheiro, se fazia campanha na cara e na coragem. As dificuldades eram superadas pela motivação de se andar pela estrada levando uma mensagem de esperança. O tempo passou e muita coisa mudou. Os partidos cresceram em número e em recursos, mas perderam muito o foco na boa prática política. O parlamento piorou, o jogo é pesado e os interesses inconfessáveis. Quando se vê Ana Mozer, mulher, militante de primeira hora, atleta reconhecida no mundo do esporte, ser afastada do Ministério, em nome da governabilidade: além de doído é insustentável.
Em menos de uma década, sobrevivemos a um verdadeiro tsunami. Um golpe para afastar uma presidenta eleita democraticamente; um candidato a presidente preso para não poder concorrer ao seu terceiro mandato; a farsa do Ministério Público e do Poder Judiciário em manter Lula preso; a armação da condenação e seu impacto na eleição de 2018, já fazem parte da nossa recente história. O resultado da tragédia, só não vê quem não quer.
Infelizmente, para milhões de brasileiros, a percepção só veio durante o mandato do "sem noção". Foram quatro anos de sofrimento, descaso e falta de ética na gestão pública. Na saúde, mais de 700 mil mortes por covid; no meio ambiente, com a porteira aberta, desmataram o que podiam; na educação, quatro ministros incompetentes se encarregaram sucatear o nosso ensino; na segurança a ordem veio de cima, armem o povo; com o patrimônio público, permitiram que prosperasse a escandalosa privatização da Eletrobras.
O legado desse passado recente se mistura com a podridão do presente. Como podemos admitir a bandidagem do dia 8 de janeiro; como não se envergonhar dos aviões da FAB carregando joias e drogas; como ser indiferente ao rastro de maldades deixado por um capitão desqualificado que virou presidente. Ainda bem que as apurações da Polícia Federal estão mudando o curso dessa história. As instituições de Estado estão atentas aos fatos, comprometidas com a Lei.
O Brasil não é uma republiqueta. As condenações exemplares no STF aos amotinados envolvidos nos atos de terrorismo que ameaçaram a democracia, tranquilizaram o país. As delações do coronel Cid e a prisão de outros militares, sem nenhuma reação dos quartéis, nos deram segurança da volta à normalidade. O bom desempenho do governo fazendo a economia crescer e o presidente Lula ocupando seu espaço lá fora, presidindo o G20 e o Mercosul simultaneamente, nos dão a garantia de que os tempos e os ventos são outros.
Só que não podemos nos descuidar, como aconteceu em 2018. Novos aventureiros estão se movimentando para seguir o caminho da desinformação coletiva e da mentira inescrupulosa. Não se pode esquecer do que ocorreu. A urgência de uma Reforma Política é uma proteção à nossa jovem democracia. Pela demora em pautar tema tão relevante, obviamente, é porque não há interesse. No entanto, não se enganem: sem olhar para a realidade política do país o futuro continuará sendo uma incerteza.
Um presidente não pode ser alvo de interesses obscuros, chantageado dentro do próprio Congresso, em nome de uma "governabilidade". A sociedade já percebeu o quanto a pulverização partidária apequenou a política. Permitiu que se formassem bancadas para atender interesses específicos, a ponto de se tornarem mais poderosas que a maioria dos partidos. A política precisa ser valorizada na sua essência e as anomalias precisam ser devidamente combatidas. A política só serve se for pensada e praticada para o bem comum.
PS- Acima, foto com o Lula, na campanha para deputado estadual em 1994. Depois vieram outras eleições que me levaram à Câmara de Vereadores de Florianópolis, por dois mandatos. Em 2002, me elegi deputado federal por Santa Catarina. Nunca troquei de partido. Afastado da vida partidária, em razão da criação do Instituto IDEAL, desde então faço política motivado por temas e desafios.
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