Na semana em que as mortes por Covid 19 destruíram 500 mil famílias brasileiras e perdi três amigos, o assunto deveria ser a desgraça que se abateu sobre nós. Voltamos a ter uma média de 2000 mortes por dia, que leva o Brasil para a vexatória posição de segundo lugar no mundo em mortandade. Na nossa frente só a Índia, cuja população é seis vezes maior do que a nossa. Uma tragédia humana que poderia ter sido evitada.
O registro macabro que ora faço é um resumo da angústia diária que nos chega pela CPI da Covid e pelo Consórcio de Imprensa, cujo trabalho é desdenhado por Bolsonaro e seus seguidores. A impressão que dá é que o governo gostaria de encobrir tudo de nós. A versão oficial seria outra, como a do deputado Osmar Terra, do gabinete paralelo, que no final do ano passado afirmava que as mortes não chegariam a 800.
Apesar do momento de dor que passamos, o tema reservado para o blog é outro. Em comum, também trata da desinformação e do desmonte do Estado. Na terça-feira, 22, podemos perder o controle sobre o setor elétrico. Por mais que se tente explicar as consequências que virão dos "jabutis" implantados por deputados e senadores na MP 1.031/2021, que trata da privatização da Eletrobras, pouco a sociedade sabe. As transformações aprovadas vão encarecer a energia elétrica, como todos os técnicos ouvidos afirmam, só que o governo prefere atender lobistas e insiste em encobrir essa realidade.
Ninguém sabe quanto vai custar o desatino de implantar 6 GW em térmicas a gás, onde não tem gás. A potência é metade de uma Itaipu que dois países levaram mais de 10 anos para construir. Só que lá havia um rio, o Paraná. Agora onde querem colocar as térmicas, nas regiões norte e nordeste, nem gasoduto tem. A obrigatoriedade de comprar 2 GW de pequenas centrais hidrelétricas é outro "jabuti" inexplicável. A indenização ao Piauí pela privatização da Cepisa, só quem pode explicar é o pai do "jabuti", o senador Ciro Nogueira do Centrão. De fora ficou o maior dos "jabutis", as térmicas a carvão que de tão pesado que era caiu da árvore. Propor o volta do carvão é alimentar o atraso. (*)
A Medida Provisória enfrentou resistência no Senado. A votação foi apertada, 42 x 37, e o tema volta para a ser debatido na Câmara. Espero que desta vez com mais responsabilidade. Existem três situações que não foram observadas: o desmonte do setor elétrico e suas consequências, a insegurança jurídica e o desinteresse das multinacionais pelo Brasil.
Quanto ao desmonte do setor e a insegurança jurídica quem é do ramo percebe, fizeram de uma empresa pública com mais de 60 anos, um monstrengo. Totalmente engessada por uma MP descabida, com seus planos de investimento e expansão definidos por lobistas. Já em relação ao desinteresse pelo Brasil de Bolsonaro, estudo do WEF (World Economic Forum) de 2019, já alertava para isso.
"As empresas estão cada vez mais atentas e sabem identificar melhor do que nós os ambientes nas nações. E não é por outra razão que estamos registrando uma debandada das mesmas. Deixaram o Brasil recentemente Ford, LG, Nike, Mercedes-Benz, Roche, Sony, Cabify, Nintendo, 3M e Walmart". Para os bolsonaristas mais radicais, o comentário não é meu - é de Paulo Feldmann. (**)
Portanto, como tenho uma compreensão do papel desenvolvimentista do setor elétrico, publicamente conhecida nos meios de comunicação e no Congresso Nacional, através de legislação, artigos e pronunciamentos, é importante ouvir e citar outras pessoas como forma de ampliar o olhar. Espero que a observação do Paulo, que me apropriei, ajude na reflexão dos parlamentares sobre a privatização da Eletrobras.
(*) JABUTI expressão muito usada no debate sobre a MP 1.031. É um contrabando que se empurra durante a tramitação de uma matéria legislativa. Quase sempre associado a um interesse econômico de um determinado grupo. Como "jabuti" não sobe em árvore, foi a mão do homem que o colocou lá. Quando é muito pesado, como no caso do carvão, cai.
(**) PAULO FELDMANN, professor de economia da USP, ex-presidente da Eletropaulo (governo Covas/PSDB), foi diretor presidente da Microsoft, Ernst & Young e Sharp.
PS - As manifestações que ocorreram no sábado pelo FORA BOLSONARO só vieram a confirmar que o movimento cresce.
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